Depois do Treinador, do Presidente e do Capitão da ADCR Pereira, hoje damos voz a um adepto. Mas não um adepto qualquer. O nosso entrevistado desta semana é alguém que vive o futebol intensamente e, como o próprio faz questão de referir, cuja ligação ao clube é "quase umbilical".
1 - João, desde
muito novo ligado ao clube, começaste como atleta. Depois, uma lesão grave pôs-te
fora de campo e iniciaste o teu percurso como treinador. A lesão apenas
antecipou um futuro anunciado ou foi a forma que encontraste para te manteres
ligado ao clube?
JFG - Sim, comecei como atleta mas a minha ligação ao clube começa antes. A minha ligação ao clube, não
devendo ser única, é peculiar. O meu avô foi jogador do clube, para muitos mesmo
o melhor, e capitão, e o meu pai foi jogador, capitão e treinador, logo a minha
ligação começa quase no berço. É quase como que uma cátedra. Tenho e
continuarei a ter uma ligação quase umbilical ao clube. No que diz respeito à
questão propriamente dita, é óbvio que a lesão antecipou a decisão. Ainda que
não tenha sido um praticante fora de série, é evidente que teria gostado de ter
continuado a praticar. Não tendo sido possível, e aqui o meu pai teve um papel
fulcral, optei pela vertente técnica. Em boa hora! Sou muito melhor treinador
do que fui jogador, sem dúvida.
2 - Começaste nas camadas jovens do ADCR Pereira. Sabendo que continuas atento aos escalões de formação, pergunto-te se consideras que há talento no clube? Podemos estar descansados quanto ao futuro?
JFG - Continuo atento aos escalões de formação e sim, há talento. A rodos! Se podemos estar descansados quanto ao futuro, depende. No que diz respeito ao talento, claramente que sim, no entanto é necessário trilhar um caminho sustentado no que diz respeito à formação, o que não tem acontecido nos últimos anos, arriscaria a dizer que nos últimos 15/20 anos essa sustentabilidade não existiu e urge que as entidades decisórias olhem para a formação de uma forma séria e como a possibilidade real da evolução do e de um clube.
3 - De que forma pensas que um clube como o ADCR Pereira pode potenciar esse talento e evitar que os miúdos que se destacam saiam precocemente para outros emblemas?
JFG - Obviamente que será com a criação
dos respectivos escalões de formação. Como disse na resposta anterior, é
necessário um desenvolvimento sustentado e só desta forma é possível garantir a
continuidade dos jovens no clube. Temos perdido grandes, enormes valores a
partir da formação. Devo dizer, no entanto, que o presidente está a fazer um
grande esforço neste sentido. Digo-o por saber ser verdade.
4 - Em
termos de condições de trabalho, achas que ainda existe muito para fazer?
Consegues identificar diferenças entre as que existiam no “teu tempo” e as que
existem actualmente?
JFG - Relativamente às condições, bem,
neste momento são magníficas. Não se pode exigir mais. Começando pela
construção dos novos balneários e finalizando com a implantação do relvado, que
está fabuloso, estas são condições inigualáveis. No que diz respeito às
diferenças entre as condições do “meu tempo”, ou “nosso tempo”, e as actuais, não existe paralelismo possível. Relativamente às existentes enquanto jogador e posteriormente
enquanto treinador, as actuais são sem dúvida melhores, no entanto devo
ressalvar que enquanto treinador nunca me queixei e sempre desenvolvi, ou
desenvolvemos, o meu/nosso trabalho com rigor e seriedade. Devo terminar
utilizando uma citação de Fernando Pessoa, que serve também para finalizar as duas questões anteriores: “Condições de palácio qualquer terra larga tem, mas onde
estará o palácio se não o fizerem ali?”. É necessário explorar ao máximo as
potencialidades daquele espaço magnífico, caso contrário ficará sempre a
sensação de subaproveitamento…
5 - Depois, veio a experiência como Treinador-adjunto nos Seniores, numa época em que a equipa ficou aquém das expectativas. O que correu mal?
JFG - A experiência como adjunto nos
Seniores foi uma experiência enriquecedora, como faço questão que todas sejam,
no entanto, de facto, não correu dentro do esperado. Desde logo, porque não
começou bem, com um vazio directivo que quase deitou tudo a perder. E depois, porque se começou muito tarde, com indefinição de quem seria o treinador, se
haveria, eventualmente, dinheiro para a inscrição de jogadores e de todas as
operações logísticas inerentes. Depois, no plano pessoal, houve, claramente,
muita falta de experiência da minha parte. Aliás, costumo confidenciar que
comparando a actualidade com aquela altura, eu não sabia praticamente nada. No
entanto, foi uma experiência que me ajudou a crescer, isso é lógico, não tenho
dúvidas e, apesar de tudo, tive muito gosto. Afinal, estava a representar o meu
clube.
6 - Tencionas um dia voltar a trabalhar no clube como Treinador principal?
JFG - É lógico que tenciono, aliás nunca
o escondi e nem nunca fiz, nem faço, questão de o esconder. As pessoas sabem o
que sinto pelo clube. Mas devo dizer que não faço disso um “cavalo de batalha”.
Serei treinador principal quando tiver que o ser e quando ou se o entenderem…
7 - Já no AR Casaense, voltaste a treinar os escalões de formação. Quais as diferenças encontradas? Na altura, não te sentiste a regredir? Ou, pelo contrário, achaste que devias “dar um passo atrás para depois dar dois à frente”?
JFG - A principal diferença que
identifiquei foi a organização do clube. Encontrei um clube extremamente
organizado, com planificação de tudo, desde qual o balneário onde cada escalão
equipava, até à obrigatoriedade de cada elemento do clube, incluindo os
treinadores, se apresentar nos treinos ou jogos com o equipamento e as
respectivas insígnias do clube. Na altura, sinceramente, não considerei ser um
passo atrás. Na época anterior tinha tomado a decisão de sair do ADCR Pereira porque me sentia agarrado ao lugar e senti que os jogadores tinham a
necessidade, e porque não o direito, de conhecer um novo treinador, com outros
processos, outros métodos. Não há treinadores iguais. Saí sem nenhum convite.
Em Junho de 2010, durante uma conversa meramente informal com o Paulo
Barreirinhas, amigo e antigo colega de equipa, falei-lhe da minha decisão e um
mês depois estava no AR Casaense. Considero que foi a viragem no meu processo
evolutivo. Conheci treinadores fantásticos, inclusive o próprio Barreirinhas, e
dois deles são as minhas grandes referências, a par do Fernando Gonçalves, de
quem fui adjunto, e do meu pai, claro. São eles o Rui Carlos e o Jorge
Rodrigues. O Rui é um mestre do futebol, antigo jogador profissional de Académica,
Estoril, entre outros, ensinou-me muito, muito mesmo, respira futebol. Com o
Jorge foi algo de inexplicável. Treinámos os Iniciados e criámos uma empatia
difícil de descrever, que se transferia para a equipa, tanto ao nível do treino
como do jogo. Fizemos uma grande época, na qual alcançámos o 3.º lugar na
classificação, à frente, por exemplo, da Académica. Tive um prazer enorme em
trabalhar com os dois. Foi uma experiência incrível e, hoje, tenho um grande
respeito pelo AR Casaense.
8 - Neste momento, estás afastado do futebol por opção ou os convites não têm surgido?
JFG - Estou afastado por opção.
Felizmente, os convites têm surgido, até de uma equipa do distrito de Leiria.
Não aceitei nenhum até agora por considerar não ser “aquele” convite, apesar do
convite do clube do distrito vizinho ser muito, bastante aliciante, a distância
falou mais alto. No entanto, continuo aberto a propostas e tenciono voltar a
treinar tão brevemente quanto possível.
9 - O ADCR Pereira começou o Campeonato de forma irregular, com uma vitória e duas derrotas. Como espectador atento que és, o que pensas do actual momento da equipa?
JFG - O que o ADCR Pereira precisa, neste
momento, é de tranquilidade. Não vou tecer grandes comentários, mas sei que têm
um grupo forte e vão ser capazes de ultrapassar o momento. São situações que
acontecem e só não passa por elas quem nunca dirigiu uma equipa. Ser treinador
é mais difícil do que as pessoas imaginam…
10 - Em tua opinião, o que tem falhado? Consegues apontar alguma vertente do jogo que necessite de ser melhorada?
JFG - Conseguir, consigo. No entanto, não
me parece ético estar a tecer tal tipo de apreciação neste espaço. Por respeito
ao Mister João, mas, sobretudo, por respeito à instituição que me ensinou a ser jogador,
a ser treinador e, especialmente, a ser Homem, não o farei. Além disso, como
disse na resposta anterior, a equipa precisa de tranquilidade.
Muito Obrigado!
Muito Obrigado!
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ResponderEliminarJoão, as tuas palavras, nesta entrevista, revelaram, a quem não conhecia, uma visão bastante arejada da realidade do futebol, no seu todo.
ResponderEliminarEu, felizmente, já a conhecia.
Respondes-te a todas as perguntas com seriedade e diplomacia.
Gosto especialmente desta citação de Fernando Pessoas: “Condições de palácio qualquer terra larga tem, mas onde estará o palácio se não o fizerem ali?”. É necessário explorar ao máximo as potencialidades daquele espaço magnífico, caso contrário ficará sempre a sensação de subaproveitamento…”
Pereira, parece-me, salvo melhor opinião, ser uma terra em que há pouco tempo para pensar e planear, para ouvir e saber ouvir.
Opta-se, quase sempre, pelo orgulho.
Errar está no código genético de todos os seres humanos, sem excepção.
Mas há seres humanos que julgam estarem livres desse gene!